Petição Contra a Proibição do Cabelo Natural nas Instituições de Ensino

Petição Contra a Proibição do Cabelo Natural nas Instituições de Ensino
A importância deste abaixo-assinado
À
EXCELENTÍSSIMA PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA NACIONAL SRA CAROLINA CERQUEIRA
=LUANDA=
C.c: Exmo Presidente da República Exma
Vice-Presidente da República
Ministério da Educação
Ministério da Cultura e Turismo
Comissão para a Educação e Cultura da Assembleia Nacional
Provedoria da Justiça.
Imisi Simão Alexandre de Almeida, César Chiyaya, Ladislau Alexandre da Silva, Antónia Rafaela Gonçalves Adão, Kyesse António Lino, Delson Domingos, Isaac Pedro Vieira Paxe, Manuel das Mangas, Florita Cuhanga António Telo, em representação das/os demais subscritores da presente petição, cidadãs e cidadãos angolanos, com os demais dados de identificação em anexo, doravante designadas/os Requerentes, vêm nos termos do n.os 2 e 4 do artigo 41, da Constituição da República, conjugado com os artigos n. 1 e al. a) do n.1 do artigo 2 da Lei n.º 9/22 de 20 de Abril apresentar:
PETIÇÃO PÚBLICA
Com base nos seguintes factos e fundamentos:
1. No dia 19 de Setembro de 2022, foram postas a circular nas redes sociais imagens de jovens angolanos, impedidos de terem acesso às aulas em uma instituição de ensino, pelo facto de usarem o seu cabelo natural, o que constitui uma violação grave e grosseira ao direito ao Ensino, previsto no art.º 79.º Constituição da República de Angola “CRA”;
2. Decorridos alguns dias, uma cidadã angolana, denunciou publicamente outra instituição de ensino (Colégio Dona Joaquina e Sumbe) que não permitiu o seu filho ter acesso às aulas por usar o cabelo natural (estilo black). A instituição reagiu de forma ríspida mantendo a posição de não permitir que o jovem regressasse às aulas sem antes cortar o cabelo;
3. Quando se esperava que as instituições de ensino tivessem ganhado já consciência da acção/actuação violadora dos direitos fundamentais das cidadãs e dos cidadãos, eis que no dia 28 de Setembro do corrente ano, a jovem Leonilde Gabriel foi expulsa da sala de aula, na escola “22 de Novembro”, sita no Maculusso – Luanda, por aparentemente o professor entender, que não tinha o cabelo penteado. Em rigor, a jovem estava somente a usar o seu cabelo natural;
4. Outrossim, tem se constatado que em muitas destas instituições, estudantes mestiços ou brancos não sofrem este tipo de impedimento, quando vão às aulas com o seu cabelo natural, longo ou não penteado ou mesmo despenteado, nunca se questionando a aparência desse tipo de cabelo ou a sua higiene, como se gozassem da presunção de beleza, de adequação e de limpeza. Como se a genética proporcionasse tudo isso;
5. Esta prática tem sido recorrente quer em instituições de ensino públicas como privadas, sendo as principais vítimas crianças e jovens, ainda em fase de construção da sua identidade, com poucos conhecimentos para se defenderem destes abusos.
6. Mais do que as implicações legais, é fundamental lembrar das consequências psicológicas para estas crianças e jovens que são o futuro da nação, nomeadamente, baixa autoestima e problemas de autoaceitação, só para citar as mais graves.
Nesta senda, a semelhança de quaisquer cidadãs ou cidadãos que velam pela legalidade e o cumprimento escrupuloso da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE ANGOLA e das demais Leis, as/os Requerentes, denunciam às autoridades competentes os actos excessivos e inconstitucionais lesivos de direitos fundamentais que se vão verificando ao longo dos últimos dias pelo que entende:
a) O Direito ao ensino previsto na Constituição Angolana, não distingue o seu acesso a cidadãs ou cidadãos negros, mestiços ou brancos, pelo contrário, gereraliza o acesso quando o legislador constituinte prescreve que “ O Estado promove o acesso de todos ... ao ensino.” n.1 art.79 CRA;
b) Tal actuação, das instituições de ensino, cria uma situação de desigualdade de tratamento ao acesso ao ensino, na medida em que, no caso dos jovens rapazes, a exigência de se cortar o cabelo é feita apenas aos de tom de pele escura, ou seja, negros;
c) Ademais, a Constituição impõe que “A iniciativa particular e cooperativa nos domínios do ensino, ... exerce-se nas condições previstas na lei.” (n.º 3 art.79 CRA). As instituições que impedem o acesso às aulas, a jovens negras/os que usam o seu cabelo natural, violam a lei e a Constituição limitando-os o acesso ao ensino por razões de ordem estética, senão mesmo racista.
Excelência.
d) A Constituição Angolana consagra o Direito à Liberdade de Consciência o que em si permite às pessoas assumirem as suas convicções sem que com isso sejam “privados dos seus direitos, perseguido ou isento de obrigações” por tais motivos, n.º 2 art.41;
e) Ademais, nos marcos das ciências humanas, a questão da negação da condição do cabelo dos povos africanos é interpretada como produto dos processos de colonização que produziram discursos e práticas de estigmatização e de negação dos traços da identidade cultural dos povos africanos.
f) É neste sentido que Amilcar Cabral afirma que a luta pela independência dos povos africanos era eminentemente cultural; sendo por isso considerado comportamento alienado e contrário aos princípios do Pan-Africanismo pela autodeterminação dos povos africanos toda reprodução voluntária de práticas discriminatórias assentes na negação da identidade antropológica dos negros.
Neste sentido, cônscios de que Vossa Excelência melhor discernimento fará da presente situação, instamos que se notifique: a) os Ministérios da Educação bem como da Cultura e Turismo, para o desenvolvimento de um quadro legal e de acções conducentes a superar as estruturas geradoras destas culturas nocivas presentes na gestão de alguns estabelecimento de ensino; b) as instituições que realizaram as práticas supracitadas e que se responsabilizem as que continuarem.
Luanda aos 30 de Setembro de 2022.