Carta Popular por Cidades para Todas e Todos

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Natan Arend criou este abaixo-assinado para pressionar Candidatas e Candidatos às Prefeituras Municipais do Estado do Rio Grande do Sul nas eleições 2020

Prezadas Candidatas e Prezados Candidatos às Prefeituras Municipais do Estado do Rio Grande do Sul nas eleições 2020,

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Essa Carta foi co-redigida pela Rede Urbanismo contra o Corona - Núcleo RS, pelo BR Cidades - Núcleo RS, pelo Comitê Popular em Defesa do Povo e Contra o Coronavírus,  pela  Federação Nacional de Estudantes de Arquitetura e Urbanismo do Brasil - Regional Sul e pelo Observatório das Metrópoles - Núcleo POA, com o objetivo de visibilizar as pautas e lutas da sociedade civil organizada no enfrentamento aos efeitos diretos e indiretos da pandemia de COVID-19 em território gaúcho. O conteúdo apresentado parte de contribuições trazidas por 42 lideranças comunitárias e 16 movimentos sociais, durante as 12 horas do Fórum Urbanismo Contra o Corona nas Comunidades e Movimentos do Rio Grande do Sul, ocorridos nos dias 22 e 29 de agosto e 12 de setembro. 

A pandemia evidenciou a situação catastrófica em que vivem as populações historicamente vulnerabilizadas, tanto socialmente quanto ambientalmente. Dentre os diversos problemas enfrentados, se sobressai a ausência do Estado no atendimento dos direitos sociais de todos os cidadãos de acordo com o Art. 6º da Constituição Federal: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” 

Assim sendo, é urgente a elaboração de programas de Estado voltados às populações vulnerabilizadas, que são nocivamente atingidas pela lógica urbana imposta pelo Capital. Para isso, se faz necessário o cumprimento dos instrumentos urbanos do Estatuto da Cidade (2001), principalmente no que tange: o combate às desigualdades urbanas, a garantia de boas práticas de gestão, a participação da sociedade civil nos processos decisórios, e que também contem com o fortalecimento dos Conselhos Municipais, com a retomada de atribuições usurpadas, e avanços no sentido de promover participação ampla e popular.

As lutas e os desafios enfrentados pelas comunidades e pelos movimentos foram registrados durante o Fórum e serão apresentados nessa Carta a partir dos seguintes tópicos: Equipamentos Públicos Comunitários (saúde, educação, cultura e lazer); Trabalho, Emprego e Renda; Infraestrutura Urbana (saneamento, energia elétrica e acesso à internet); Seguridade Social (fome, violência e controle da pandemia) e Habitação e Regularização Fundiária

Esperamos que as candidatas e os candidatos, para quem essa Carta é direcionada, se sensibilizem com o quadro de carência do básico e do essencial enfrentado por grande parte da população gaúcha, e se atente à potência da voz popular na reconstrução da economia, da educação, da saúde e, principalmente, da sociedade, em um ‘’novo normal’’: justo, participativo e equânime.

 

Equipamentos Públicos Comunitários (saúde, educação, cultura e lazer)

Com o coronavírus potencializou ainda mais esses inacessos à saúde pública, à direitos, trabalho, moradia digna (...) vive-se em uma precariedade muito grande, uma vez que o coronavírus evidencia essa briga de classes, esses abismos sociais (...). A gente tá falando de uma comunidade que não tem acesso à água e a sabão (...), a gente tá falando de uma comunidade que as pessoas não tem a preocupação com o contágio uma vez que já existem problemas anteriores que nunca foram sanados...”  Pedro, Comunidade Tancredo Neves - São Leopoldo

Os principais problemas reivindicados cotidianamente pelas populações vulneráveis estão relacionados à inexistência ou precariedade no acesso aos serviços públicos de direito universal, como: saúde, educação, cultura e lazer

Em período de pandemia, demandamos que as futuras governanças das cidades necessitam ampliar o escopo do que se entende por saúde pública, principalmente em territórios de vulnerabilidade, tanto no fortalecimento dos serviços oferecidos pelo SUS, como postos de saúde e assistência social,  quanto no tratamento dos espaços residências (casas saudáveis) e citadinos (cidades saudáveis) a fim de garantir o isolamento social. Destacamos também a relação entre a saúde pública e os resíduos urbanos, visto que o descarte inconsciente tem agravado vários problemas de saúde nas Comunidades de Catadores. 

Tratando sobre educação acessível e universal, reivindicamos: a necessidade de inclusão digital de estudantes e famílias, às aulas e atividades remotas, a necessidade de vagas em creches e escolas infantis, a importância da alimentação escolar e a implementação de projetos de educação extracurricular para manter os jovens ocupados e longe das drogas.

Tratando sobre cultura e lazer, reivindicamos: A criação de espaços de convivência e lazer para jovens e crianças, a disponibilização de espaços de cultura e a oferta de espaços para prática esportiva, atrelados à projetos de tratamento paisagístico. 

 

Trabalho, Emprego e Renda

A gente sai do nosso país com o mesmo objetivo de ter uma qualidade de vida melhor [...] e conseguir realizar nossos sonhos. [...] A gente sofre bastante isso [preconceito racial e xenofóbico]. [...] A questão do desemprego era ruim antes da pandemia, e agora com a pandemia, temos um desligamento dos trabalhadores imigrantes em massa [...], muitos que não conseguem resgatar a rescisão salarial. Muitos têm os pagamentos suspensos [...] e não conseguem sacar o auxílio emergencial. Temos que melhorar a situação dos imigrantes [...].” James,  Associação da Integração Social (AINTESO)

"A questão dos resíduos é invisível porque todo mundo descarta seu resíduo mas poucos conhecem o seu caminho."; Associação Catadores/ CEA-CTVP

O desemprego cresceu durante a pandemia, e a falta de renda atinge desproporcionalmente as mulheres chefes de família e as mulheres negras, que ficaram sobrecarregadas em função dos cuidados familiares, domiciliares e empregatícios (quando empregadas). Grande parte das comunidades, dizem que “trabalho, emprego e renda” estão entre os principais problemas enfrentados. Aquelas que não perderam seus empregos, sofrem os impactos da redução salarial e precarização do trabalho. Assim sendo, clamamos por políticas de geração de empregos de qualidade e renda digna às mulheres e demais populações vulnerabilizadas, o fortalecimento da economia local,  de cooperativas e dos pequenos comerciantes.

Nesse grupo estão os catadores de resíduos recicláveis, que estão cotidianamente expostos ao COVID-19,  visto que, praticamente todo o resíduo das áreas urbanas e rurais passam por eles.  A categoria esbarra em diversas dificuldades, muitas vezes impostas pelo poder público e pelas entidades reguladoras, o que é agravado nos municípios nos quais os grupos ainda não possuem uma estrutura sólida. A luta diária dos catadores para fazer a reciclagem precisa de apoio político e popular, além de, reconhecimento da sociedade. Precisamos romper a barreira do interesse financeiro que move as coletas de resíduos nos municípios, auxiliar apoiar a organização das cooperativas de catadores e recicladores e pôr em prática a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007 Art.24 XXVII.  

Os camelôs, ambulantes, feirantes e demais trabalhadores e trabalhadoras que exercem suas atividades em espaços públicos, com o isolamento social, perderam o direito ao trabalho. Nesse contexto, cientes da gravidade da pandemia, os movimentos representantes articularam-se para a conquista do auxílio emergencial. Ainda assim, em vários casos, o auxílio foi insuficiente ou não chegou nas mãos de quem precisava com a urgência necessária. 

Já para os pequenos agricultores, a pandemia evidenciou a ausência de políticas de desenvolvimento, de compras e de aquisição de alimentos da agricultura familiar. Durante a pandemia, as prefeituras pararam de adquirir os alimentos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), optando por cestas básicas de supermercados. Logo, reivindicamos não apenas que se retome as compras dos agricultores familiares, mas também que aumentem o percentual de participação deste setor na alimentação escolar, e sugerimos a construção de um auxílio para aqueles que foram afetados pela seca, assim como a retomada de programas habitacionais para os pequenos agricultores.

 

Infraestrutura urbana (saneamento, energia elétrica e acesso à internet);

temos dificuldade de acessos aos serviços públicos (...) nossas águas são improvisadas com mangueiras (...) só tem esgoto as famílias que têm condições financeiras um pouquinho melhor e conseguem custear esse esgoto, os que não têm, têm o esgoto direcionado à rua aberta. Isso nos deixa expostos a hepatite e outras milhares de patologias relacionadas à fezes.” 
"Se não temos acesso a luz que é o básico, como teremos acesso a internet?" Letícia do Nascimento, Ocupação Jardim Continental (Morro Santana, Porto Alegre)

"Nossa comunidade não tem internet que possibilita, por exemplo, estar num espaço como este [Fórum]. Então além de todas as outras demandas, ainda temos a segregação da comunicação. (...) O que fazer com as crianças com aulas remotas?" Yashodhan Abya Yala Comunidade Kilombola Morada da Paz/Território de Mãe Preta

Os problemas relacionados à infraestrutura urbana ocupam um espaço muito significativo dentre as reivindicações comunitárias. Mais da metade das lideranças dizem que suas comunidades enfrentam problemas relacionados ao saneamento ambiental desde antes da pandemia. No Brasil, o saneamento básico é um direito assegurado pela Constituição e definido pela lei nº. 11.445/2007. Entretanto, a verdade é que a precariedade ou inexistência de acesso à esse serviço essencial é uma realidade escancarada nos espaços onde se localizam as comunidades de baixa renda. As famílias que não podem pagar por equipamentos sanitários adequados, são obrigadas a conviver com esgoto a céu aberto, além daquelas que vivem em casas sem banheiro e sem acesso ao abastecimento de água. 

O acesso ao saneamento ambiental é uma questão de saúde pública, logo, deve ser um serviço público, de direito universal que necessita que seja resolvido urgentemente, para que se diminua a proliferação de doenças, se aumente a qualidade de vida da população e se controle as internações hospitalares devido à Covid-19. Ou seja, nunca ficou tão evidente a relação entre saúde pública e direito à moradia e à cidade. 

A segregação digital é outro problema que tem ganhado destaque nas Comunidades. O acesso à serviços de internet, no contexto atual, está diretamente relacionado ao direito à educação, já que parte significativa dos estudantes não têm acesso à computadores, celulares e internet, tornados necessários com as aulas remotas durante a pandemia. Sugerimos a implementação de tarifas sociais de acesso à internet, como um programa de inclusão dessas comunidades, tanto no que se refere à comunicação, ao acesso à informação e principalmente à educação básica. 

 

Seguridade social (fome, violência e controle da pandemia);

"O descaso da gestão pública é algo que nos assusta, é algo que nos surpreende, porque é tanto descaso, é tanta indiferença com a população das periferias (...) e que hoje a gente percebe como o corona apenas acentuou as problemáticas que já existem, tanto na área de assistência social, como na área de geração de trabalho e renda, como na questão da comunidade em geral, na questão do desemprego [...].” Ana Paula Medeiros de Lima, Centro de Educação Ambiental da Vila Pinto Porto Alegre (CEA/CTVP)

A violência contra a mulher aumentou drasticamente durante a pandemia. Sabendo-se que em grande parte dos casos, a vítima é próxima do agressor ou reside no mesmo local, a frequência das agressões aumentam e a possibilidade de denunciá-las se tornou ainda mais difícil. É fundamental que o empoderamento e protagonismo feminino estejam à frente das decisões urbanas e que o estado promova ações de fortalecimento aos grupos de mulheres já existentes e organizados pela sociedade civil. Esses grupos têm um papel fundamental no que tange ações relacionadas, sobretudo ao apoio em situações de violência, a geração de trabalho e renda e como consequência a independência financeira. 

A pandemia potencializou as dificuldades já enfrentadas pelos imigrantes em situação de vulnerabilidade social: dificuldade de integração com a sociedade devido ao preconceito, a xenofobia, e a dificuldade em se colocar no mercado de trabalho. Sugerimos a inserção dos imigrantes nos processos políticos democráticos, bem como a legitimação e visibilização de seus discursos através da mídia, como  forma de integração sócio cultural. 

Destacamos a invisibilidade vivida territorialmente, politicamente e socialmente pelos povos tradicionais de matriz africana e indígena, por consequência de acordos diplomáticos feitos no passado brasileiro e que ainda são pactuados por uma sociedade racista, preconceituosa e que não compreende a história do próprio país e as contribuições que esses povos têm nela. É preciso enunciar o histórico racista e desigual da sociedade brasileira, que produz um território culturalmente embranquecido. 

A fome também é um problema generalizado, resultado da negligência estatal diante de diversas questões já citadas ao longo deste documento. Esta realidade aqui abordada levou à necessidade de auto organização e de mobilização dentro das próprias comunidades em conjunto aos movimentos, através de campanhas de arrecadação de recursos para compra e distribuição de alimentos, máscaras, materiais de higiene e limpeza. Solidariedade Ativa, uma ação de trabalhador para trabalhador (do campo para a cidade) que se configura na distribuição de alimentos com caráter organizativo na luta por direitos. 

Por fim. destacamos que nenhum protocolo foi  efetivado pelo poder público no sentido de garantir que as comunidades tenham condições de cumprir as determinações da organização mundial de saúde e, por isso, as comunidades e movimentos se organizaram de forma autônoma pela garantia da sobrevivência em seus territórios. 

 

Habitação e Regularização Fundiária

"Uma das grandes dificuldades que a gente vem enfrentando diz respeito muito à falta de comprometimento dos governos com a questão da habitação popular, em todos os níveis, obviamente. O município lavando as mãos, utilizando principalmente recursos federal especialmente da Minha Casa Minha Vida para construir em regiões periféricas (...) onde se leva a população mais empobrecida, cada vez mais  para a periferia, construindo empreendimentos em regiões onde os equipamentos, transporte público uma série de questões essenciais não tem nem suficiente para quem já mora (...) em ocupação de regiões do Centro da cidade e regiões próximas é essencial nesse sentido, que compreende o Direito à moradia também como um Direito à Cidade…” Ceniriani Vargas da Silva, Movimento Nacional de Luta pela Moradia 

São evidentes as violações do direito à moradia através dos despejos e remoções forçadas que já estavam ocorrendo e persistem durante a pandemia. Ressaltamos a importância da campanha “despejo zero”, a garantia do não despejo é essencial para este momento, mas deve ser mantida para o período pós pandemia.

O programa habitacional “casa verde e amarela” não garante a efetividade do acesso à moradia, não se propõe a dialogar com os movimentos e nem a atender o problema habitacional da faixa 1.  Além do direito à moradia, precisamos falar do direito à cidade. A segregação socioespacial ocasionada pela periferização dos programas de habitação popular, ocasionou o deslocamento das populações para áreas desprovidas de serviços públicos. Precisamos de programas habitacionais com subsídio Estatal, projetos de IPTU progressivo, resgate de prédios públicos ociosos ou imóveis que não cumprem sua função social, para destiná-los à moradia popular. Além de, viabilizar a cedência/doação de áreas públicas municipais para Cooperativas Habitacionais construírem loteamentos e moradia popular ou venda para as entidades a valor simbólico revertido para o Fundo Municipal de Habitação.

Em relação à inadequações habitacionais, problema enfrentado por praticamente todas as famílias que vivem em Comunidades, seja pelo adensamento das habitações, ou  pelas condições arquitetônicas, sugerimos a implementação de programas de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social nos moldes da Lei Federal nº 11.888/2008).

Outra exigência fundamental, é tomada pelos povos Tradicionais Quilombolas e Indígenas, em relação à regularização e titulação de seus territórios, para que possam, de uma forma livre, garantir a criação dos seus filhos e filhas, seus netos e netas em respeito à suas matrizes. 

 


Para concluirmos, destacamos que a justiça socioespacial é uma questão de saúde coletiva e um tema urgente para ser tratado pelas futuras administrações públicas, no sentido de tornarmos nossas cidades sustentáveis e alinhadas ao ODS 11 - Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis e suas transversalidades com os demais ODS, especialmente aqueles diretamente relacionados com os temas abordados nesta Carta.


O Desenvolvimento Sustentável almejado pelas agendas internacionais não pode se restringir a soluções que tratem das questões ambientais estritas. Mudanças nos paradigmas econômicos e sociais são centrais para um novo modelo de desenvolvimento no qual o compromisso com o enfrentamento das desigualdades sociais e espaciais em todas as suas formas é condição fundamental, pois as causas e consequências do atual modelo impactam sobremaneira as populações e territórios historicamente excluídos.

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